"Alabardas, Alabardas, Espingardas, Espingardas"
Ed. Companhia das Letras
Lançamento: 2014
Ed. Companhia das Letras
Lançamento: 2014
No livro, cujo título foi
retirado da tragicomédia "Exortação da guerra”, de Gil Vicente, o Prêmio
Nobel de Literatura de 1998 apresenta a história de Artur Paz Semedo, um
apaixonado por armas, apesar de nunca ter dado um tiro ou ter segurado uma
espingarda ou algo relativo.
Semedo é contabilista da
empresa de material bélico Belona S.A. Ele sabe que, economicamente falando, a
empresa onde trabalha é importante, pois as vendas de armamento e munições não
param, e as guerras nunca acabam. E ele gosta disso.
A mulher dele, de nome
Felícia, é uma pacifista convicta. Os dois estão separados (não oficialmente),
mas ainda conversam entre si. Numa dessas conversas, Artur diz a ela que, após
ler “L'Espoir” (Esperança, em tradução livre), livro do francês André Malraux
que aborda a Guerra Civil da Espanha (1936-1939), descobre que, certa vez,
operários sabotaram um obus em Milão. E morreram por isso.
Semedo relata à mulher que,
quando leu o trecho referente à façanha dos operários, enfureceu-se. Como
funcionário de uma empresa de material bélico, ele não gostou de imaginar que
alguns funcionários sabotaram uma arma e, por isso, ficou feliz com ao ler
sobre a morte deles.
Felícia, sutilmente, ouve e dá
uma sugestão: que ele investigue a história da empresa onde trabalha para
descobrir o que ela fez durante a Guerra Civil Espanhola.
Convencido pela mulher, cujo
objetivo, aparentemente, era apenas conhecer a história da própria empresa,
acompanhamos os primeiros passos de Artur Paz Semedo em busca do passado da
Belona S.A.
E é durante esse resgate
histórico que a história termina, sem ponto final ou vírgulas. Acaba-se poucas
páginas depois de o contabilista descobrir que, em 1933, a empresa cogitou
fabricar materiais agrícolas.
Com esse final inesperado
por conta da morte do autor, ficamos livres para nos questionarmos sobre os
rumos que o romance iria tomar. O que será que Felícia queria com a história da
empresa? O que Artur Paz Semedo iria descobrir? Isso não sabemos e nunca vamos
saber.
Mas em relação ao que já
está escrito, podemos tirar algumas conclusões.
Saramago, a partir de Artur
Paz Semedo, Felícia e Belona S.A., volta às alegorias iniciadas em “Ensaio
sobre a cegueira” (1995), e isso é ótimo. Apesar de “Caim” e “A viagem do
elefante” (2008) serem bons livros, as poucas páginas de “Alabardas...” já os
superam.
Nesse livro, o autor
português mostra o quão ignorante e doente está a sociedade em relação às
guerras e às armas.
Nós, assim como Artur, somos
(da) Paz. Mas, igual a ele, muitos de nos não se importa com notícias ou
situações em que a morte, as armas e a destruição imperam e que, muitas vezes,
os mais fracos são eliminados. Sem reflexão e sem a compreensão de que as armas
são criadas para matar a vida e, por outro lado, dar mais vida ao capital.
Felícia, por sua vez, é a
consciência que cada um de nós deveria ter. Mesmo que não fiquemos juntos o
tempo todo, relacionar-se com ela é fundamental. Essa mulher/consciência, assim
como Blimunda, em “Memorial do Convento” (1982), é forte. Assim como a mulher
do médico, em “Ensaio sobre cegueira” (1995), é o contraponto moral à
insanidade que toma conta da contemporaneidade.
Belona S.A. é o nosso mundo.
Nós criamos a nossa própria destruição, muitas vezes sem nos darmos conta
disso. Por isso, devemos descobrir a história dele para mudá-lo e mudarmos a
nós mesmos também.
Além da história de Semedo, “Alabardas...”
conta com ilustrações de Günter Grass e com três textos extras. Um do ensaísta
espanhol Fernando Gómez Aguilera; outro
do escritor italiano Roberto Saviano; outro do antropólogo brasileiro Luiz
Eduardo Soares.
E tem mais. Nove notas
escritas por Saramago em relação à produção da obra estão presentes. Numa
delas, descobrimos que o autor iria terminar o livro com a seguinte frase: “Vai
à merda”.
Como se sabe, o autor não
terminou a obra com essa frase. Mas isso não importa. O que importa é que
Saramago, a partir da própria obra, vive. E viverá para sempre.
* Está resenha foi publicada em outubro deste ano no jornal cultural "O Duque".
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